Do verbo ao desatino

"E o diário - meu diário, estou tão feliz de ter você comigo outra vez! Em momentos inesperados, no intervalo entre pacientes - uma nota fugaz me basta. É meu mundo, meu ego. Reconheço e admito. Não vou mais sentir vergonha , não o vou mais esconder nem embelezar". (Anais Nin - Fogo, 19 de março de 1935)

Estava lendo Fogo, da Anais Nin, e pensando na escrita, no diário, na vida, refletindo sobre as coisas que eu deixei de falar, nas verdades que eu ocultei por tanto tempo, de mim, dos outros, enfim, a maneira como a Anais levava a vida dela me fez parar pra tentar me enxergar um pouco. Sei lá, não tem nada a ver uma coisa com a outra, mas como ela, eu sou muito instável, muito! Não a ponto de ser bipolar, mas sou instável, sensível, irritada, nervosa, tímida...eu oscilo muito de humor, sou impaciente e às vezes egoísta demais. Eu juro que não quero dar a mínima pra o que eu tenho dentro de mim, apenas escrever, porque eu nunca mais escrevi o que eu realmente estou sentindo, por medo de ser mal interpretada. Essa é uma das minhas grandes angústias, a de nunca saber me expressar do jeito certo, e sempre ser mal entendida. Também sou muito distraída a ponto de alguém me dizer que fulano de tal, que eu nem conheço e nunca vi na vida, me viu num seu onde, sendo que eu tava em outro canto, e não perguntar como esse fulano que eu não conheço me conhece a ponto de dizer: eu a via em tal canto. Pois é, coisas pequenas assim, me fazem ficar mal, e ficar preocupada, mesmo que eu nem tenha culpa, não dessa vez. Detesto mal entendidos. Eu tinha o mal hábito de calar muita coisa, de não me importar me importando com coisas que são realmente importantes pra mim, porque eu também tinha o hábito de achar que ninguém nunca poderia gostar verdadeiramente de mim, logo de mim, porque nem eu mesma sei se gosto de mim, e ainda mais me amar. Eu sempre achei difícil alguém me amar de verdade, mas também sempre fiquei atordoada se alguém não gosta de mim, e eu fico sabendo disso. Logo eu, também, que não faço mal a ninguém, procuro ser o mais discreta possível. Um dia desses, eu parei pra pensar e vi que realmente eu não sou uma pessoa gostável. Sério, não sou. Sou grosseira demais, costumo machucar sempre que me sinto machucada, é meu escudo, meu orgulho me faz ferir os outros, em qualquer situação que me faça pensar que eu não sou desejada, que não sou respeitada, por ai vai. E quem sofre são os mais próximos, como o Gilmax e a mamãe. Outras pessoas até falam muito, só faltam me engolir, mas eu até relevo, mas essas duas pessoas é como se fossem as pessoas que eu mais espero que não me machuquem, embora machuquem, e eu também os machuque. Mas isso faz parte do amor, e do meu jeito, e eu percebi que eu não sou anormal. Me cansa dizer tudo isso porque eu já sei de tudo, já escrevi muito sobre isso, mas a cada dia, a cada passo, as coisas se consolidam, e fica mais difícil de eu conviver comigo mesma. Eu já aceitei muitas coisas minhas: preferências culturais, sexuais, musicais, sentimentais, instabilidade, meus lampejos de alegria e depressão, ter tentando me matar uma vez, enfim... tanta coisa, e...e sei lá. Tenho passado por tanta coisa, e ao mesmo tempo, foi tão pouco, e eu fico exagerando como se fosse o fim dos tempos! Como sempre, essa sou eu! Não tem como negar e nem evitar. 

Precisava conversar isso comigo mesmo. Me explicar pra mim mesma. Tentando superar alguma coisa que no momento eu não sei o que é. Eu que sempre reclamo que alguma coisa sempre está errada, não tenho do que reclamar, não hoje. Embora esteja com muita cólica e com a menstruação atrasada ainda, com uma reação alérgica a não sei o que, acho que a chocolate, porque eu sou teimosa, não tenho o que reclamar hoje. Ainda é cedo, eu sei...

Fiz planos, de supetão, fiz uma proposta pra junho. Ele aceitou. Esperar que se realize, porque não vejo a hora de ver...

A noite, ele veio me ver, e resolvemo ir tomar umas cervejas, comer feijão verde e porção de calabresa, no nosso point. Foi ótimo, mas fiquei bêbada. Voltei pra casa com muito sono e só cheguei, tomei banho e me deitei. Ele me ligou pra desejar boa noite.